Além da área do Direito
Sobre segmentar clientes – A ideia de que qualquer tipo de cliente serve para qualquer escritório de advocacia ainda é comum. Mas será que isso faz sentido na prática? Muitos escritórios continuam tratando o mercado como um bloco homogêneo, o que compromete não apenas a comunicação e a formação de proposta de valor, mas também a eficácia do atendimento jurídico.
Chame como quiser: persona, prospect, público-alvo. O importante é reconhecer que entender com profundidade quem é o cliente que você quer atender é fundamental para se comunicar melhor, gerar confiança e construir propostas mais assertivas. Esse entendimento vai muito além da área do Direito. Ele passa pela realidade econômica, operacional e cultural dos segmentos em que esses clientes atuam.
Talvez você já tenha escutado de um colega ou mesmo dito algo parecido: “aqui no escritório, atendemos empresas de todos os tipos”. Mas pense bem: os desafios jurídicos de uma fintech são os mesmos de uma transportadora de grãos? A forma como você conversa com o CEO de uma rede de varejo é a mesma de um produtor rural? Os termos, a linguagem, os temas de interesse, os contextos regulatórios e os riscos são os mesmos? Difícil acreditar.
A verdade é que cada setor econômico possui seu próprio ecossistema, suas entidades representativas, suas regras informais, suas dores e suas expectativas. E é justamente a compreensão desse contexto que diferencia o advogado comum daquele que se torna um conselheiro estratégico.
Segmentar para entender melhor
Segmentar significa dividir para entender melhor. Quando você organiza seus esforços com base em setores econômicos, passa a enxergar padrões. Começa a identificar quais são os principais problemas jurídicos enfrentados pelas empresas de determinado setor, quais os temas que geram mais litígio, onde estão os riscos e onde estão as oportunidades. Essa visão gera valor para o cliente.
Mas o que é setor econômico, afinal? Setor econômico é uma classificação usada para organizar as atividades econômicas com características semelhantes. Cada país tem seu próprio padrão de classificação. No Brasil, usamos a CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas), coordenada pelo IBGE. Nos Estados Unidos, são comuns os códigos SIC (Standard Industrial Classification) e NAICS (North American Industry Classification System).
Essas classificações ajudam a organizar setores como: agronegócio, saúde, construção civil, educação, tecnologia, logística, financeiro, entre muitos outros. Cada um desses setores possui uma dinâmica própria. E isso importa muito para a prática jurídica.
Prática do Direito é uma coisa. Setor econômico é outra.
Direito Tributário, Cível, Trabalhista, Ambiental, Societário. São práticas do Direito. Setores econômicos são ambientes onde essas práticas são aplicadas. Parece simples, mas é uma confusão comum.
Um mesmo serviço jurídico – como uma auditoria tributária – precisa ser adaptado para atender às peculiaridades de diferentes setores. As normas mudam, a jurisprudência pode variar, os procedimentos operacionais da empresa têm impacto direto na forma como o trabalho será feito.
Tomar consciência dessa diferença muda tudo. Permite que você personalize sua proposta, mostre que entende do negócio do cliente, use exemplos reais do setor dele. Isso aproxima. Isso gera conexão. E isso aumenta a chance de contratação.
Como outras áreas fazem para segmentar clientes
Consultorias empresariais, como as chamadas Big Four (Deloitte, EY, PwC e KPMG), já entenderam isso faz tempo. Elas não apenas segmentam seus serviços por setor, como também estruturam suas equipes com base nessas divisões. Existe um time para atender o setor de energia, outro para o de varejo, outro para a indústria farmacêutica. Esses grupos contam com consultores técnicos e também com profissionais de marketing, vendas, conteúdo e gestão. Tudo é feito sob medida para aquele universo.
O mesmo ocorre com escritórios do Magic Circle, como são conhecidas as cinco bancas mais prestigiadas com sede em Londres: Allen & Overy, Clifford Chance, Freshfields Bruckhaus Deringer, Linklaters e Slaughter and May. Esses escritórios organizam suas áreas de negócio não apenas por prática jurídica, mas também por setor da indústria. Marketing, Business Development, eventos e publicações seguem essa lógica.
Por que isso funciona? Porque o cliente sente que está falando com alguém que compreende seu mundo. Alguém que sabe as dores específicas do seu setor, que acompanha as notícias relevantes, que pode antecipar riscos e sugerir soluções mais rápidas e aderentes.
Quais as vantagens para o(a) advogado(a)
Segmentar sua carteira por setor econômico permite uma série de vantagens práticas. Fica mais fácil produzir conteúdo relevante, pois você sabe exatamente quais são os temas mais quentes daquele mercado. Também ajuda na prospecção: você passa a falar com uma linguagem mais alinhada, gerando empatia desde o primeiro contato.
Outro ganho é na formação de equipes. Com uma base segmentada, você pode treinar seu time com mais foco, criando especialistas naquele mercado. Isso aumenta a produtividade e reduz erros. Também melhora a imagem do escritório: você passa a ser percebido como uma referência naquele segmento.
A comunicação institucional também se beneficia. Ao planejar campanhas ou atualizar o site, você consegue mostrar experiência em setores específicos. Pode criar páginas dedicadas a cada setor, relatórios temáticos, artigos, newsletters, cases. Tudo isso contribui para gerar autoridade.
Como começar
Não precisa mudar tudo de uma vez. O primeiro passo é mapear sua base atual de clientes e entender quais setores econômicos são mais recorrentes. Use a CNAE para ajudar nessa classificação. Veja onde está a concentração, avalie o faturamento por setor, identifique oportunidades de crescimento.
Depois, comece a montar pequenos planos de ação. Se você tem muitos clientes do setor educacional, por exemplo, aprofunde-se nas normas do MEC, acompanhe as discussões sobre ensino a distância, crie conteúdos voltados a gestores de escolas e universidades.
No contato comercial, adapte sua linguagem. Mostre que você conhece os termos do setor, cite cases similares, antecipe tendências. Não se limite a falar do seu serviço jurídico. Fale sobre o mercado do cliente. Fale sobre o negócio dele. Isso cria conexão.
A equipe de marketing pode entrar junto, ajudando na criação de peças direcionadas, campanhas segmentadas, pesquisas de mercado e programas de relacionamento.
Diferencial competitivo real ao segmentar clientes
O escritório que escolhe se organizar por setor econômico sai na frente. Consegue gerar mais valor, se comunicar com mais assertividade, ser lembrado com mais facilidade. Além disso, cria um posicionamento mais claro e atrai clientes mais alinhados.
Nem todo escritório precisa seguir esse modelo, mas se você já atende um número expressivo de empresas em um mesmo setor, essa organização pode ser o diferencial competitivo que faltava. Pense nisso. Talvez você esteja perdendo oportunidades por não segmentar.
Comece pequeno, mas comece. Entenda o setor. Fale a língua dele. Participe dos eventos certos. Publique nos lugares certos. Mostre que você está inserido naquele ecossistema.
No fim das contas, você não está vendendo um serviço jurídico genérico. Você está oferecendo soluções para problemas reais de um mercado real. E é isso que todo cliente quer: alguém que entenda o seu mundo.