Por que insistir?
Como a onda “anti-woke” pode estar influenciando o mercado corporativo brasileiro e por que insistir nas pautas ESG.
Por Tamires Auad
Contexto
Não é segredo para ninguém que os conceitos de sustentabilidade e inclusão vêm sendo considerados em estratégias de crescimento e, especificamente, comunicação digital de grandes empresas ao longo dos últimos anos.
O que nem todos sabem é que os termos em questão têm sido discutidos no cenário internacional há, pelo menos, 50 anos, com destaque para a preocupação global em razão da possível escassez de recursos frente às projeções de produção para os anos seguintes, e o estímulo à participação ativa da sociedade em prol de um desenvolvimento econômico em consonância com a preservação do meio ambiente – o famoso “Triple Bottom Line” de John Elkington, que intersecciona as dimensões da sustentabilidade ambiental, social e econômica.
A preocupação é antiga, no entanto, foi apenas em 2020 – com a viralização do vídeo do assassinato de George Floyd por um policial branco nos Estados Unidos – que as pautas raciais passaram a centralizar as discussões empresariais, corroborando o termo “woke” (significado literal de “acordei”; utilizado para referenciar o despertar para temas sociais e políticos, sobretudo, para o racismo). Para além dos valores éticos e morais e da eclosão de perspectivas humanizadas estimuladas pela pandemia de Covid-19, os motivos da priorização de pautas de inclusão envolveram a influência do mercado financeiro americano sobre o brasileiro, evidenciada pela conexão comercial previamente estabelecida entre os países.
É esse mesmo motivo que, atualmente, também vem desacelerando a discussão das empresas frente às pautas de diversidade no Brasil: em 2023, a Suprema Corte norte-americana declarou que ações afirmativas para aumentar a quantidade de estudantes negros, latinos e de outros grupos subrepresentados nas universidades dos Estados Unidos eram inconstitucionais. A declaração, no entanto, foi apenas o começo do que viria a ser o ataque à onda woke, ocasionando o movimento antagônico intitulado “anti-woke”.
Há poucos dias, o presidente recém-eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, expressou por meio de manifestações polêmicas a desaprovação de pautas woke e de diversidade, equidade e inclusão. De acordo com Trump, “fundos federais não devem ser usados para promover a ideologia de gênero”, razão pela qual assinou um decreto que suspende a emissão de passaportes norte-americanos com o gênero “X”, (que até então referia-se a pessoas que não se reconhecem como masculinas ou femininas), bem como ordenou que agências federais eliminem menções à ideologia de gênero em contratos, descrições de cargos e contas de redes sociais, determinando que o governo reconheça apenas dois sexos biológicos.
As declarações do presidente são representativas da redução das áreas de DEI em grandes empresas de tecnologia e o corte nos investimentos relativos ao tema no mercado corporativo norte-americano. Recentemente, a Meta – dona do Facebook e Instagram – decidiu encerrar seu programa interno de diversidade e inclusão, que englobava a contratação e treinamento de funcionários, além da seleção de fornecedores. A ação certificou a declaração precedente do fundador e Diretor Executivo da Meta, Mark Zuckerberg, que lamentou o aumento de empresas “culturalmente neutras”, após afirmar que o mercado corporativo precisa de mais “energia masculina”. Além de validar uma perspectiva já muito explorada — a perda da qualidade técnica em prol da equidade de gênero —, a fala simboliza o questionamento da legitimidade de pautas sociais, ambientais e de governança como um todo.
O contexto certamente é favorável para empresas que já desejavam abandonar a pauta, nunca a tendo priorizado da maneira mais adequada e explorando pequenas ações desarticuladas por meio das práticas de greenwashing, pinkwashing e correlatas. No entanto, não representa empresas que incorporaram genuinamente a pauta ESG em suas estratégias.
Por que insistir?
Em meio ao refluxo da pauta no mercado corporativo, grandes empresas ainda vêm reforçando seus compromissos e fomentando ações sustentáveis, firmando sua postura da resistência.
Por ora, o modelo pode parecer contraproducente, no entanto, é preciso olhar para o futuro a longo prazo com atenção e apreço. As injustiças sociais e a crise climática crescem exponencialmente, de modo a refletir em múltiplos aspectos da vida cotidiana, afetando diretamente a severidade das temperaturas, a perda de espécies da fauna e flora, a ampliação de riscos para a saúde, a escassez de comida e recursos, a elevação dos níveis de desemprego e,
consequentemente, o mercado de consumo. Caso essas razões não sejam suficientes, veja, abaixo, alguns outros “porquês”:
Nova onda woke?
Nova onda woke? Não se sabe quando ou como. É fato, no entanto, que grupos subrepresentados já ocuparam o mercado de trabalho, bem como o mercado de consumo, portanto, passaram a ser acolhidos em suas respectivas opiniões, desejos e direitos. Com a emancipação feminina e o recrudescimento de mulheres ocupando cargos de liderança e empreendedorismo, a legitimidade das pautas LGBTQIAPN+ e o fenômeno da globalização e a redução de fronteiras entre países e culturas, vivenciamos uma era ainda mais representativa para a sociedade como um todo. Dessa forma, a retomada da pauta social é esperada, caso um mercado consumidor amplo e uma vasta gama de profissionais diversificados sejam de interesse global.
Conformidade Legal
Quer queira, quer não, a legislação brasileira prevê responsabilidade penal e administrativa para agentes causadores de danos ao meio ambiente e incentiva economicamente a sustentabilidade, por meio de linhas de financiamento verde e isenção de impostos para determinados serviços e produtos sustentáveis. Adicionalmente, o mecanismo garante direitos fundamentais por meio da Constituição Federal de 1988 e demais legislações específicas, como a CLT, o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei Maria da Penha e a Lei de Cotas para Pessoas com Deficiência, que se relacionam, em alguns casos diretamente, e em outros subjetivamente, com o modus operandis do mercado corporativo brasileiro.
Tendência global
A reunião de 2025 do Fórum Econômico Mundial de Davos, referenciado globalmente como propulsor de tendências econômicas anuais, evidenciou a contraposição entre as atuais falas de Donald Trump e a tendência global à cooperação internacional entre países e organismos multilaterais, reforçando o destaque à importância do Acordo de Paris recentemente deixado pelos EUA, que visa enfrentar as mudanças climáticas e seus impactos negativos.
A ocasião reforça a priorização da agenda ESG nos planos estratégicos governamentais, além de repreender objetivamente as declarações do atual presidente dos Estados Unidos em relação à exploração e dependência de combustíveis fósseis frente ao desenvolvimento de tecnologias sustentáveis e fontes renováveis.
Os escritórios de advocacia e a tendência sustentável e inclusiva no contexto digital
Se é tendência global, é motivo de atenção. Apesar do que pode parecer ser uma onda perenemente contrária às pautas ESG, é fato que a estrutura global já se adaptou e incorporou mecanismos sustentáveis nas agendas dos respectivos países, razão pela qual o mercado corporativo continuará seguindo práticas sustentáveis. Desse modo, escritórios de advocacia que mantiverem suas posições em relação à pauta ESG tendem a assegurar a fidelidade de sua carteira de clientes, bem como representar a segurança jurídica necessária em termos regulatórios, contenciosos e consultivos nas frentes ambientais, sociais, de transparência, compliance e governança.
O posicionamento de um escritório enquanto referência está, atualmente, diretamente relacionado à manifestação de sua autoridade no contexto digital, razão pela qual investir nas redes sociais para expressar credibilidade e reforçar sua expertise jurídica frente às pautas ESG será uma tendência acertada e positiva para 2025. De acordo com o Datareportal (2024), buscas online e anúncios em redes sociais representam 58,9% das indicações de usuários para principais formas de descobrir novas marcas e produtos. Além disso, o índice também reporta que seguir marcas de interesse em redes sociais é a ação preferida de engajamento para 42% dos usuários em trocas de incentivos. Assim, ignorar o posicionamento sobre pautas ESG no contexto digital pode ser uma decisão equivocada em 2025.